TENSÃO EM CASA
Desde ontem que a coisa por aqui não está fácil. Minha filha Joana, seis anos, passou o final-de-semana nervosa. Hoje ela fez a sua primeira prova. Fiquei mais tenso que ela.
Domingo a Joana estudou o dia inteiro, isto quando não comia. Eu não estudei porque só comia, tenso.
A primeira prova que enfrentaria em sua vida seria a de inglês.
Ela acordou cedo na primeira chamada, arrumou-se na dela, não quis Toddy e nem iogurte, a maçã nem tocou. Jejum total. Entrou em silêncio no carro, no caminho vi pelo retrovisor que colocou o dedo na boca e olhava pra fora da janela, olhar fixo pro nada. Ao chegarmos na escola eu desejei boa sorte e não me respondeu "obrigada". Repeti mais alto e escutei: "tá boooom, já sei!"
Voltei pra casa e trabalhei a manhã toda preocupado se ela se sairia bem. Inglês! Melhor que na minha época no São José de Porto União que era o latim.
Lembrei-me de tempos atrás no Ceará uma passagem com o meu grande amigo Claudiomar.
Claudiomar era o presidente da Associação dos Moradores da Vila Nova, vizinha à minha fazenda. Numa das idas a Fortaleza eu o levei junto - fiz isto muitas vezes, a cada viagem levava dois ou três nativos para conhecerem a capital.
Claudiomar ficou doido com os arranha-céus da Praia de Iracema, e de tanta gente!
Num restaurante pedimos ariacó grelhado, peixe de dois quilos, carne branca, maravilhoso. Próximo a nós um casal de turistas não sabia o que pedir, nós estávamos em três pessoas. Eles olhavam os comensais como se procurassem o que escolheriam.
Claudiomar levantou-se foi até eles, confabularam, muitos gestos. Eles sorriam, o garçom se aproximou e o Claudiomar fez o pedido, o mesmo que nós. Retornou à mesa e perguntei:
- Conseguiu entender o que queriam?
- Sim, foi fácil, eles falam "ingrês" e de "ingrês" eu entendo.
Quando fomos embora a mulher levantou o braço e deu um tchauzinho em agradecimento ao Claudiomar. O homem fez o tradicional ok de aprovação. E ele:
- A mulher gostou, mas ele não, viu só? Me mandou praquele lugar! - falou injuriado.
Pois chegou a hora de buscá-los na escola. Assim que encostei entraram alegres no carro.
- Como é, Joana, foi bem na prova de "ingrês"? - pergunto.
- Fui, foi fácil, a tia só perguntou duas coisas, eu sabia muitas, muitas. E não é "ingrês", né. É "English", viu? - corrigiu-me.
Chegou em casa e dormiu toda a tarde. Disse que estava "muito cansada" da prova.