Lembro-me de que em minha infância, todas as noites o meu pai entrava no quarto do meio, onde dormíamos eu, minha irmã e o meu irmão, para conferir se todos estávamos ali, bem acomodados. E só percebia o seu abrir de porta porque normalmente eu estava acordado e fingindo dormir (adorava aquele carinho e cuidado), pois ele tinha uma habilidade incrível de entrar e sair sem incomodar. Mas quando ele se retirava, que fechava a porta, os sentimentos de morte me inquietavam somente em pensar na possibilidade de um dia perdê-lo. E ali, debaixo do meu lençol, num pensamento pueril e egoísta, eu chorava baixinho e clamava a Deus pedindo que me levasse antes dos meus pais para não sofrer a dor de perdê-los um dia.
Hoje faz 4 meses que o meu pai partiu. E como bem definiu minha filha, numa homenagem: "Foi embora um ser humano iluminado, do falar mais bondoso e do agir mais gentil. Nos consola saber que viveu a melhor vida possível, repleta de amor, energia, independência e disposição, até os últimos dias".
Até chegava a pensar algumas vezes que Deus iria atender àquela minha petição de outrora, pois era tanta energia, independência e disposição que o meu pai tinha que no meu subconsciente ele era imortal. Foi muito impactante ter que quebrar a porta do seu quarto e encontrá-lo ali, inerte e sem vida, ainda quente, recostado na lateral de sua cama, todo arrumadinho e alinhado para ir trabalhar. Foi muito difícil!
Aos poucos, bem aos poucos mesmo, a gente vai tolerando a ausência. A saudade maltrata, maltrata... e maltrata. E as lembranças das nossas conversas, das risadas e dos nossos planos, embora sejam muito boas, são muito marcantes e me machucam demais. Eu chego a sentir o seu cheiro e ouvir sua voz:
"Avexado pra começar a construir sua casa, meu filho" - infelizmente não deu tempo (essa daí é a foto dele no meu terreno) :-(
Era um exímio Mestre de Obras, profissão que fora admitido na Chesf em 1958. Se aposentou em 1987 como Encarregado de Subestação III. Mas, mesmo aposentado, e com 82 anos, ele não parava quieto.
Bem, eu sei que é recente ainda e que essa ferida uma hora vai se fechar, mas confesso que o consolo pós perda tem vindo a conta-gotas. Por ora é beber cada gota desse cálice amargo, por pior que ele pareça ser, e sair incólume e forte deste luto.
Reitero a Deus o meu agradecimento pelo privilégio de tê-lo permitido estar presente por 49 anos em minha vida como pai, amigo, conselheiro e parceiro em todos os meus momentos neste mundo. E que o Seu Espírito Consolador, como um bálsamo, conforte a mim e toda a minha família, sobrepondo à dor a Esperança de um dia nos reencontrarmos.
"[...] Bem-aventurados os mortos que, desde agora, morrem no Senhor... para que descansem das suas fadigas, pois as suas obras os acompanham." Apocalipse 14:13
Tava com saudade desse fórum. Abraço em todos.