...Eu estava me preparando para correr a maratona de Berlim e decidi que minhas ultimas três semanas de preparação seriam no Quênia, correndo e aprendendo com os melhores do mundo.
Foi uma experiência única viver e treinar ali por três semanas. Mas a principal lição que tirei daquele período foi que não importa muito a teoria, desde que o trabalho seja feito.
Um episódio ilustra bem o quão simples e direta é a visão do atleta queniano sobre treinos e competições. Eu tinha acabado de fazer uma série na pista (de terra) em que os quenianos estavam treinando. Estava um dia claro, com sol forte e, apesar da altitude, a temperatura estava alta. Terminando o treino, já sem a camisa, um atleta me pergunta com forte sotaque local, apontando para meu monitor cardíaco:
- What is this? (O que é isso?)
- Heart Rate Monitor (Monitor cardíaco)
Ele me olha com uma cara de que ouviu acelerador atômico de partículas quânticas e continua:
- What do you run? (O que você corre?)
- Marathons. (Maratonas, eu respondi)
- What is your time? (Qual seu tempo?)
- Two fifty. (Dois e cinquenta)
- Two fifteen? Not good. (Dois e quinze? Não está bom)
- Not two fifteen. Two fifty. (Dois e quinze não. Dois e cinquenta)
- Two fifty? Why do you run? (Dois e cinquenta? Por que você corre?)
No Quênia, corrida é profissão, não lazer. Ou seja, correr uma maratona em 2 horas e 50 minutos não faz sentido. Para eles, um intervalo razoável seria abaixo de 2 horas e 12 minutos.
Depois daquela viagem, minha preocupação com teoria de treinamento de corrida acabou. O importante é fazer o que tem que ser feito.
Rotina e disciplina executadas consistentemente por um prazo longo levam à perfeição. A perfeição nesse caso é um limite pessoal. Cada indivíduo tem seu limite. Não perca muito tempo lendo qual a melhor maneira de treinar para correr, simplesmente corra. Mas se você corre como profissão, não faz sentido correr se não estiver entre os melhores.
Pedro Cerize