FIIs são quase um IPO no mundo dos investimentos e isso dificulta entender o retorno ao cotista. Este é um resumo do que eu aprendi no início desta história e pode ser útil pra você:
1- No longo prazo, o valor do principal investido tende a ser corrigido pela inflação.
Verdade, pelo histórico centenário de valorização dos imóveis.
2- No longo prazo, o valor do provento mensal tende a ser corrigido pela inflação.
Mentira. A receita do aluguel tende a ser corrigida pela inflação, mas o provento distribuído ao cotista não. Isso porque o fundo precisa pagar as despesas (que também tendem a ser corrigidas pela inflação) antes de distribuir o provento. Quanto maior a relação despesa/receita, menos o provento tende a ser corrigido pela inflação.
3- FII é conservador, pois não pode contrair dívida e nem operar alavancado.
Mentira. No mundo real, temos fundos disfarçando endividamento e alavancagem na forma de CRI ou outras rubricas em contabilidade criativa. A julgar pela inércia dos órgãos reguladores, não parece ser ilegal. A julgar pelo aumento explosivo no número de cotistas, não parece ser imoral. Mas ambos (endividamento e alavancagem) estão lá.
4- O risco do cotista se limita ao capital investido.
Mentira. Teoricamente, evento catastrófico proposital ou acidental pode culminar em chamada de capital e você perder mais do que investiu. E não adianta pensar que é só vender as cotas quando a calamidade se instalar, porque não é tão simples assim. Nunca aconteceu, até que aconteça.
5- Como 95% do lucro precisa ser distribuído, boa parte do retorno ao cotista tende a vir pelo provento.
Mentira. Com a base de dados que disponho (via Bastter.com), analisei 2011-18 para HGLG e KNRI e 2013-18 para SDIL. Em todos, o provento mensal, em base anual, teve rendimento real negativo. O que tornou o rendimento real positivo no período para estes fundos não foi a (decrescente) distribuição dos lucros por cota, mas sim a cotação. Sim, lucro distribuído por cota caindo e cotação subindo.
6- A emissão é boa para o cotista.
Pode ser verdade ou mentira, dependendo do que você considera bom para o cotista. O gestor tende a ficar com o real benefício tangível (remuneração garantida), enquanto o cotista tende a ficar com o prometido benefício intangível (aumento do patrimônio do fundo e melhor diversificação interna). Com o tempo, cabe ao gestor transformar o prometido benefício intangível em real benefício tangível ao cotista. Obviamente, há uma nítida assimetria de previsibilidade no resultado da emissão, com amplo espaço para melhora.
7- A emissão dilui o cotista que não subscreve.
Verdade. Sua participação total no fundo será sempre diluída após a emissão, mas isso não é necessariamente ruim. De fato, pode até ser bom, dependendo de como o gestor vai alocar o capital levantado. Para o cotista dono de 10% de um fundo que lucra 10M, é bom ser diluído e passar a ser dono de apenas 5% se o lucro subir para 30M.
8- O gestor trabalha para o cotista.
Verdade. Quem paga o gestor é o cotista, este último dono do fundo.
9- Então, os interesses do gestor e do cotista são convergentes em caso de conflito com o locatário.
Não sei responder. Conheço pelo menos dois fundos em que o locatário é sócio controlador do gestor. Gera-se, assim, nítido conflito de interesse, que pode fazer o gestor priorizar o locatário, em detrimento ao cotista. A análise aqui deve ser individualizada.
10- Gestor e cotista ganham dinheiro da mesma forma.
Mentira. Cotistas são remunerados pelo lucro do fundo. Já os gestores, via de regra, são remunerados pelo patrimônio líquido ou valor de mercado (alguns ainda por taxa de performance). Os interesses e as formas de aumentar as respectivas remunerações, portanto, não são exatamente as mesmas. Em HGLG, por exemplo, a remuneração do gestor, em termos reais, aumentou 213% entre 2011-18. No mesmo período, o provento anual por cota caiu 34%, ainda que o retorno total ao cotista tenha sido de 40%, à custa da cotação. Neste quesito, menção honrosa à remuneração do FIIB, que mais aproxima o interesse do gestor ao interesse do cotista.
11- Bons gestores custam caro.
Verdade. Como em várias áreas, o bom trabalho precisa ser bem remunerado. Não há nada errado nisso. Mas a remuneração precisa estar alinhada ao lucro do fundo, não ao aumento do patrimônio líquido ou do valor de mercado, para evitar distorções.
12- Fundos monoimóvel ou monoinquilino são muito arriscados.
Mentira. Não há muita diferença entre alocar 100k em um único fundo multimóvel/multinquilino ou 10k em 10 fundos mono/multi, multi/mono ou mono/mono. Com a diferença nas ponderações, a diversificação passa a ser praticamente a mesma, com a vantagem de que investir em 10 FIIs diversifica também o gestor. Cuidado, no entanto, com fundos monoimóvel muito pequenos, pelo risco de takeover hostil.
13- Fundos com capital pulverizado são menos arriscados.
Verdade. Um eventual cotista majoritário tem a seu dispor amplo arsenal de potenciais maracutaias visando benefício próprio e ter o mesmo tipo de cota que ele não te protege. Em teoria, cotistas majoritários podem ser impedidos de votar em assembleia em caso de conflito de interesse, mas o limite legal é amplamente elástico e existem formas criativas de tentar contornar a restrição.
14- O mercado de FIIs é dinâmico.
Verdade. Se a situação vai permanecer assim nos próximos anos, após a maturação do mercado, não há como saber.
15- Os moderadores da Bastter.com fazem um excelente trabalho.
Verdade. E isso não se discute. Keep doing the good work.