A História da Linguagem JavaScript
comentada em 04/02/2020 07:46

## Antes (Parte 2)

O ano era 1995.

 

* A Netscape dominava o mercado de navegadores;
* A linguagem de programação Java foi lançada (antes chamava-se Oak) e fez sucesso rapidamente por possibilitar que programas pudessem ser executados em diferentes plataformas e dispositivos;
* O Internet Explorer foi lançado como parte do pacote de complementos Plus! para Windows 95.

No mesmo ano a Microsoft lançou o IE 2.0 que poderia ser adquirido via download e utilizado gratuitamente por qualquer usuário Windows incluindo empresas. A Sun Microsystems, empresa criadora e responsável pela plataforma Java[2] se concentrou em dois desafios: levar Java a navegadores e criar ferramentas de autoria web[3]. Ela chegou a criar o navegador HotJava porém não obteve sucesso. É nesse contexto que a Netscape começa a negociar com a Sun para incluir a tecnologia Java no Netscape Navigator.[4]

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2. Ambiente computacional para desenvolver programas, independente de sistema operacional ou hardware, usando a linguagem de mesmo nome.
3. Software, ou componentes de software, destinado a usuários que desejam desenvolver (criar ou modificar) conteúdo web para terceiros sem que seu desenvolvedor seja necessariamente um programador. Por exemplo: sistemas de gerenciamento de conteúdo para blogs, wikis e fórums. Mais informações em Authoring Tools and Social Media - W3C (em inglês)
4. Java: The inside story Java: The inside story (em inglês)

## Durante (Parte 3)

Nessa época os navegadores exibiam documentos HTML armazenados como arquivo de sistema com poucos componentes sem funcionalidades. Os desenvolvedores de programas portáteis com recursos de rede eram programadores Java (ou C++). Segundo Marc Andreessen, co-fundador da Netscape, a solução para tornar as páginas mais parecidas com aplicações web era ter uma linguagem que pudesse agregar esses programas ao navegador e automatizar interações de outros componentes da própria página. Bill Joy, co-fundador da Sun, também compartilhava desse pensamento.

Brendan Eich foi contratado pela Netscape para, segundo o próprio, "embarcar a linguagem de programação Scheme, ou algo parecido, no navegador web da Netscape"[5]. O que eles realmente queriam era que ele desenvolvesse uma prova de conceito[6] que obedecesse os seguintes critérios:

* Deveria ser uma "linguagem de script"[7] que fizesse parte do código-fonte no HTML e fosse executável pelo navegador Netscape;
* Scheme era só uma possibilidade; sendo ela, outra linguagem ou uma nova o importante era que deveria se parecer com Java;
* O público-alvo não era os programadores Java, era amadores e/ou profissionais que utilizariam essa linguagem como uma "cola" entre documentos HTML e interações dos componentes (imagens, plugins, applets) desses documentos, escrevendo código diretamente no HTML[8];
* Não pode ser Java pois deveria ser fácil de entender e utilizar para ser atrativo a iniciantes, mas deveria ser complementar ao Java. Mais ou menos como era o Visual Basic em relação ao C++ na época;
* Prazo de entrega: rápido.

Então Brendan Eich utilizou funções first-class do Scheme e prototypes do Self como ingredientes principais. E foi assim que ele criou o JavaScript em 10 dias. Bom, não foi bem assim... Na verdade Marc Andreessen batizou a linguagem de Mocha enquanto estava em desenvolvimento, foi renomeada para LiveScript nos primeiros beta releases do Netscape Navigator 2.0 (tinha uma moda na época de colocar "live" nos nomes) para evitar possíveis conflitos com marcas registradas e tornou-se oficialmente JavaScript quando foi implantada no Netscape Navigator 2.0 beta 3, como jogada de marketing.[9]


Se quiser tc o perfil dele no twitter é @BrendanEich

JavaScript teve um sucesso imediato e a Microsoft não perdeu tempo: lançou sua própria versão, por engenharia reversa[10], no Internet Explorer 3.0 e a chamou de JScript. E foi assim que nasceu a incompatibilidade da linguagem entre navegadores e os selos "Melhor visualizado no Netscape" ou "Melhor visualizado no Internet Explorer" que mostravam que aquele site tinha sido desenvolvido para uma versão só (geralmente por empresas que não tinham condições de pagar por mais de uma).



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5. Entrevista com Brendan Eich, de 2008 https://www.computerworld.com/article/3458282/the-a-z-of-programming-languages-javascript.html (em inglês)
6. Um modelo prático que possa provar o conceito (teórico) estabelecido por uma pesquisa ou artigo técnico (Wikipedia)
7. Expressão utilizada para se referir a programas que podem ser executados sem precisarem de compilação.
8. Texto retirado do artigo de Brendan Eich sobre a popularidade do JS, refutando argumentos de Douglas Crockford: Popularity – Brendan Eich (em inglês)
9. Comunicado de imprensa divulgando o lançamento do JavaScript Press Release (em inglês)
10. Atividade que consiste em analisar um objeto para perceber o seu funcionamento ou como foi feito. (Priberam)

@D3N1S3 @ThiagoDV

## Depois (Parte 4 e Final)

ECMA (hoje Ecma) é uma organização dedicada à padronização de sistemas de informação e comunicação. Nas próprias palavras de Brendan "(...) ficou claro para mim que o JS seria padronizado (...) Tínhamos um guru de padrões, Carl Cargill, que conhecia Jan van den Beld, então secretário-geral da ECMA (...). Carl orientou nossa padronização de JS para ECMA."[11] A Microsoft também participou desse processo já que a padronização iria reger igualmente o JScript.

Na Ecma toda especificação é uma padronização (documento formal) preparada por um comitê técnico (membros que atuam através de consenso).

Comitê Técnico =>(que prepara)=> Padronização =>(que define)=> Especificação

O comitê técnico instaurado para padronização de scripting languages é o 39 (TC39) e a padronização é a 262 (ECMA-262). O nome que a Ecma deu para a especificação foi ECMAScript.

TC39 => (que prepara) => ECMA-262 => (que define) => ECMAScript

O nome ECMAScript foi escolhido porque não poderia ser JavaScript já que era uma marca registrada pela Sun e não queriam problemas legais; a Sun não estava interessada em transferir os direitos à Ecma. A Microsoft ofereceu sua marca JScript mas os outros membros não queriam esse nome. Mesmo assim, ambas foram as principais tecnologias que influenciaram o ECMA-262. O que achei interessante é que a 1ª edição do ECMA-262 credita JavaScript™ à Netscape, e não a Sun.[12] Futuramente a Ecma registra o termo ECMAScript. Há um email público do Brendan que achei muito engraçado com a opinião dele sobre o nome ECMAScript : "ECMAScript sempre foi um nome comercial indesejado que soa como uma doença de pele."[13]

Antes de prosseguir vou fazer um resumo do que ocorreu desde essa época até os dias de hoje. Opiniões conflitantes no comitê, funcionalidades desenvolvidas pela Netscape que influenciaram novas edições do ECMA-262, a Microsoft lançou o JScript .NET e a Adobe entrou no páreo com o ActionScript para Flash. O Internet Explorer dominou o mercado de navegadores e a Microsoft passou a não se preocupar tanto com padronizações.

gráfico https://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Browser_Wars_(en).svg

Ocorreu o caso Estados Unidos contra Microsoft[14]. A Netscape foi adquirida pela AOL, a Sun pela Oracle. A maior parte dos esforços para retomar os trabalhos do TC39 vieram de Brendan Eich, agora co-fundador do projeto Mozilla, já que naquele momento o navegador web Firefox (da Mozilla) tinha uma boa participação no mercado. Nota: para participar de reuniões do TC39 com direito a voto é necessário ser membro da Ecma (leia-se, organização jurídica que precisa atender a inúmeros critérios) e o membro (empresa, instituição etc) envia seu representante às reuniões.

Voltando... qualquer mudança na especificação ECMAScript segue o seguinte processo[15]:

* Stage 0: Strawperson
* Stage 1: Proposal
* Stage 2: Draft
* Stage 3: Candidate
* Stage 4: Finished

Mudanças oficiais na especificação ECMAScript geram uma nova edição do ECMA-262. Quando uma nova edição do ECMA-262 é lançada (quase que) anualmente significa que sua documentação contém propostas no Stage 4. O TC39, no intuito de atender expectativas modernas, criou o grupo de tarefas TC39-TG1 (TG de task group) que permite a contribuição de terceiros; não é necessário que seja membro da Ecma nem empresa / instituição. Tudo é mantido publicamente no GitHub.

A principal diferença entre ECMAScript e JavaScript é o seguinte: se o seu interesse for aprender a criar uma scripting language (com qualquer linguagem ou uma nova) você lê a especificação ECMAScript. Mas se seu interesse for aprender a utilizar JavaScript você lê a documentação JavaScript.[16] É de fato um pouco confuso porque ECMAScript baseia-se em JavaScript e JavaScript baseia-se em ECMAScript e muitos textos, incluindo oficiais, podem ter termos que levem a mais confusão ainda.

Caso queira acompanhar a agenda de discussões, ver propostas ou saber como colaborar é só entrar no site ou repositório da TC39.[17]

Outras fontes sobre a história do JS: esse vídeo[18] dá um resumo muito bom e esse artigo[19] é bem detalhado.

11. Texto retirado do artigo sobre a transferência de propriedade do SpiderMonkey https://brendaneich.com/2011/06/new-javascript-engine-module-owner/ (em inglês)

12. Veja em Brief History https://www.ecma-international.org/publications/files/ECMA-ST-ARCH/ECMA-262,%201st%20edition,%20June%201997.pdf (em inglês)


13. Email de Brendan Eich Will there be a suggested file suffix for es4? (em inglês)

14. United States v. Microsoft Corp.

https://en.wikipedia.org/wiki/United_States_v_Microsoft_Corp

15. Detalhes de cada stage podem ser vistos aqui: https://tc39.es/process-document/
(em inglês)

16. What’s the difference between JavaScript and ECMAScript?

What’s the difference between JavaScript and ECMAScript? (em inglês)

17. TC39 https://tc39.es/

18. ECMAScript, TC39, and the History of JavaScript (em inglês)

19. The JavaScript Standard The JavaScript Standard

Muito obrigada @gustavo

@D3N1S3 nós que agradecemos por compartilhar conteúdo

qualquer coisa que precisar é só falar

@D3N1S3 foi pro FAQ de Web com o devido crédito. Parabéns de novo pelo texto, tá muito bom. Com certeza deu trabalho pra fazer e deixou todos nós menos burros.

Eu apaguei os comentários que não tinham relação com o texto, sobre o problema da postagem, pra leitura ficar mais linear.