Uma coisa muito perigosa é o tal do tédio. Nessa quarentena, presos em casa, estamos mais vulneráveis. Parece que o tempo custa a passar, nos arrastamos desinteressados enquanto arrastamos a barra de rolagem de promoções de lojas virtuais, de fofocas em redes sociais ou de balanços de empresas claramente ruins.
Se estivéssemos fazendo algo produtivo, não perderíamos tempo, energia, nem dinheiro desnecessariamente. Há muitas atividades para evitar isso e uma delas, talvez a mais simples e barata, é ler. Mas para muita gente ler é um martírio. Por quê? Porque não sabem ler.
Isso acontece quando alguém nos sugere a leitura e imaginamos o objeto, aquele monte de páginas costuradas; imaginamos também, ainda que muito rapidamente, o esforço mental que a leitura requer. A leitura, para quem acha que não gosta de ler, chega mesmo a doer. Fogem dela como quem foge de uma ameaça, de uma tortura.
Acontece que o objeto - o livro, o e-book - não traduz o ato de ler, ele é apenas o meio que torna a leitura possível. Ler significa, na verdade, absorver o que nos interessa, descobrir o que desafia a nossa curiosidade. E para saber ler é preciso perceber que o interesse e a curiosidades são particulares.
Você pode não gostar de ler sobre a narrativa de um mago ajudando um hobbit a destruir um anel, mas pode gostar de ler sobre as aventuras de um cavaleiro meio doido que quer comprar briga com um moinho. Um caso policial em que um detetive com sotaque francês consegue encontrar pistas que ninguém percebe e solucionar o crime como quem joga uma partida de xadrez? Ou sobre como seria se um defunto autor analisasse sua própria vida lá do além? Talvez sobre as dúvidas de uma mulher que, na escolha de um marido, está em conflito entre razão e sensibilidade? Você pode não gostar de ler ficções, mas você pode ser louco para descobrir um pouco mais das estratégias reais de Napoleão, de Alexandre, Churchill. Se a ficção e a história não interessam, há livros técnicos: como esculpir um armário, como aprender a criar um aplicativo de celular etc.
Ler é estar em contato com o que nos encanta! E temos que, em um exercício de autoconhecimento, descobrir o que produz esse efeito. O Professor Pierluigi Piazzi batia muito nessa tecla: "Todo mundo gosta de ler; o que precisamos fazer é encontrar o NOSSO livro". O que te encanta? De que você realmente gosta?
Se conseguirmos, sinceramente, responder a essas duas perguntas, podemos curar o nosso tédio improdutivo. A leitura, ocupando o nosso tempo e genuíno interesse, nos desviará dos medos inúteis que contaminam uma mente vazia. Descobrir, ou redescobrir, o ato de ler, pode ser um dos melhores remédios em uma epidemia agravada pela ansiedade. Nós estamos, de certa forma, encarcerados, mas como disse o poeta: "Posso estar preso em uma casca de noz e, ainda assim, me sentir o rei do espaço infinito". Encontre o SEU livro e você vai entender melhor essa conclusão.