Vocês já devem ter visto em diversos lugares afirmações como:
"Mais de 400 empresas do S&P500 saíram do índice"
ou
"Maioria das empresas do IBOV não está mais na bolsa".
Também tem outras variações como "ciclo de vida de uma empresa hoje é menos de 20 anos", "consultoria sei la o que diz que maioria das empresas morrem", etc.
As pessoas que usam ou repetem esse mantra dão a entender que a empresa, ao "não sobreviver na bolsa", simplesmente evaporou no ar, sem qualquer retorno ao acionista. ISTO É UMA MENTIRA.
Eu sempre me intriguei com isso. Penso nos casos como CETIP, BEMATECH, SOUZA CRUZ, todas saíram da bolsa dando um gordo dinheiro ao acionista, enquanto isso lixos quebrados ficam na bolsa mais tempo.
É uma mentira contada pelo mercado pois o mercado não quer que as pessoas saibam que um portfólio de buy and hold próprio pode ter sucesso no longo prazo. O mercado quer que você pague caro a ele para gerenciar as coisas por você.
Como ver que é mentira? Jeremy Seigel testou a hipótese em seu artigo "The Long-term Returns on the Original S&P 500 Firms".
Bem simples: um portfólio de buy and hold das 500 empresas originais do S&P500 no primeiro índice de 1957, sem NUNCA VENDER NADA (não vender spinoffs, não vender ações recebidas em fusões), dando peso igual a cada uma, retornou ~13,6% ao ano, o S&P500 no mesmo período retornou 12,4%. O índice fica girando empresas e perdeu pra ele mesmo, pra isso foi só comprar e segurar.
Por que isso acontece? Pois a maioria delas fez OPA ou sofreu fusão, uma minoria faliu!
Exemplo: National Dairy Products estava no índice original e não existe mais. Faliu? Não, foi comprada pela Dart & Kraft, depois pela Phillip Morris e assim por diante. Quem ficou com as ações que recebeu da empresa compradora até hoje auferiu 16% ao ano em dólar. Diferença brutal entre o que dizem para você ("sumiu por que faliu ou falhou e você perdeu dinheiro") e a realidade: retorno excelente.
Ou seja, fazer buy and hold no longo prazo é uma atitude que os "especialistas" querem vender para você como "vai causar sua ruína financeira pois a maioria das empresas não sobrevive" na verdade bate o índice pois a maioria sobrevive, ou se sai da bolsa te paga bem por isso. E bateu o índice fazendo a estratégia mais maluca e sem sentido possível: comprando todo S&P500 e segurando pra sempre, sendo que um investidor real iria eliminar os lixos e analisar ações fora do S&P500 também.
Segue link do estudo do Seigel:
https://rodneywhitecenter.wharton.upenn.edu/wp-content/uploads/2014/04/0429.pdfE o mais interessante: ele testou três formas de manter a carteira original, uma delas sendo "never sell", nunca vende nada, recebeu ação de empresa que comprou a original fica com ela, recebeu ação spin-off fica com ela. Comparou com estratégias que envolviam algum tipo de venda e realocação para ficar só com as originais. Qual estratégia venceu? A NEVER SELL! A que menos fez transações!
"The superior performance of the TDP is noteworthy since, as noted above, it is the most transactioncost and tax-efficient strategy of accumulating wealth from the original S&P 500 stocks. The TDP involves fewer transactions than required of a standard S&P 500 index fund since no shares are ever sold in the open market"
Repetindo a frase chave: no shares are ever sold in the open market.
E tem mais! Vamos olhar juntos o IBOV original de 1967?
Eram 17 empresas, das quais apenas Itaú, Lojas Americanas e Vale permanecem no índice. 14 delas morreram? 82% das empresas sumiram? Meu deus o que aconteceu?
Não aconteceu nada. Apenas uma faliu (1/17 = 5,8% de falências em mais de 50 anos, achei baixo).
Segue a lista:
Aços Villares: virou Gerdau S.A.;
Alpargatas: ainda existe na bolsa;
Antarctica: virou AmBev;
Banco do Estado de São Paulo (Banespa): virou Santander;
Banco Itaú: ainda existe na bolsa;
Casa Anglo (Mappin): faliu;
Cimento Itaú: fez OPA;
Companhia Docas de Santos: fez OPA;
Duratex: ainda existe na bolsa;
Indústrias Villares: fez OPA;
Lojas Americanas: ainda existe na bolsa;
Fábrica de Brinquedos Estrela: ainda existe na bolsa;
Companhia Melhoramentos Papeis de São Paulo: ainda existe na bolsa;
Moinho Santista: fez OPA;
Companhia Paulista de Força e Luz: ainda existe na bolsa;
Souza Cruz: fez OPA;
Vale do Rio Doce: ainda existe na bolsa;
Tenho certeza que quem comprou essas 17 empresas e não vendeu nada até hoje (salvo OPA, reinvestindo nas outras o dinheiro) está rindo sozinho. Carregou Souza Cruz até recentemente, mais Itaú o tempo todo, Vale, Americanas, Santander, etc. Fora o dinheiro que recebeu nas outras OPAs para reinvestir. Podem notar que apenas uma faliu, todas outras que sumiram foram compradas por outras empresas da bolsa ou de fora da bolsa, com o acionista recebendo o dinheiro para fazer o que bem entender. Na maioria das vezes essas compras tem prêmio sobre a cotação negociada na bolsa da empresa, é só pegar a grana e reinvestir onde quiser. As empresas boas compensam com folga as que ficaram ruins (Melhoramentos, Estrela, etc.). Se o Itaú entregou 140x o capital de 95 até hoje, só imaginem de 1967 até hoje. E mesmo empresas "polêmicas" entregaram bom resultado: Gerdau deu 120x o capital de 1995 até hoje. Se alguém tiver uma fonte de dados com cotação ajustada para real desde 1967 podemos calcular quanto seria o ganho dessa carteira, comprada uma vez, sem vender até hoje (algo totalmente idiota de fazer, mas que serve para destruir a bobagem de "empresas morrem no longo prazo").