Há uns 5 anos, quando era muito mais burro do que sou hoje, um colega de trabalho do setor de planejamento e suporte, que dá suporte a toda a regional, mandou um e-mail para todo meu setor informando que deveríamos entregar justificativa, plano de ação, prazos e responsáveis para um desvio que o cliente da empresa havia identificado num produto entregue pela minha regional. Averiguamos internamente no meu setor e chegamos à conclusão de que o desvio reportado estava dentro dos limites de tolerância e levamos a conclusão adiante. Aquele colega foi irredutível em dizer que tínhamos que cumprir com as exigências dele sob penalidade de perder clientes importantes para a empresa.
Fizemos contato com o setor de vendas para entender melhor a reclamação do cliente. Descobrimos que o cliente reportou o problema simplesmente "por reportar", já que o contrato possui uma cláusula que permite a ambas as partes "protestarem", cada qual a seu bel prazer, sendo a outra parte obrigada a responder, não necessariamente a aceitar o protesto como um problema e ter que resolver. A demanda original deles para "aquele" colega mostrava claramente se tratar de um simples comunicado do cliente, que foi repassado pelo setor de vendas à area de suporte da nossa regional (cumprimento de procedimento interno), que caiu no colo daquele colega que enfim decidiu que tínhamos que entregar alguma explicação e um plano para que aquilo não ocorresse de novo.
Logo soubemos que a mesma demanda havia sido enviada a todos os setores produtivos da minha regional e todos tinham chegado à mesma conclusão: não era uma falha propriamente dita mas sim um desvio esperado. Acionamos o suporte técnico da regional que corroborou com nossas conclusões. Eu tinha convicção de estar certo e me imbui da responsabilidade de levar todos os setores e o suporte técnico para discutir com o setor de planejamento e chegar num consenso (que claro seria a minha convicção de que nada deveria ser feito). Fizemos a reunião mas não houve o "consenso". Aquele colega continuou irredutível e iniciei uma discussão com ele, tentando fazê-lo entender que não era lógico corrigirmos um desvio que é esperado. Além do mais, o ganho que se teria com isso não pagaria os custos, era inviável. A discussão se acalorou e fiquei exposto. No final, apesar de tudo o que fiz e falei, tive que acatar a decisão do colega e me debruçar sobre como resolver um problema que, na minha cabeça, não tinha solução.
Temendo alguma represália (o setor de planejamento está teoricamente "acima" do setor produtivo na minha empresa e, teoricamente, ele tem mais "poder", o que deve encorajar o colega a manter a posição como manteve), usei os canais de denúncia e ouvidoria internos e acho que isso me salvou de uma coisa pior. Mas não me impediu de me sentir muito mal e vulnerável dentro da empresa por atuar da forma que acreditei ser a melhor para a empresa e tentar fazer aquele colega atuar de uma forma melhor também.
Continuei na mesma empresa mas mudei de regional. 5 anos depois, nessa semana, aquele mesmo colega veio me questionar sobre o mesmo desvio, desta vez ocorrido no setor em que estou agora. Tempos de pandemia, começamos a conversar por Skype e dentro de uns 2 minutos eu me lembrei do que ocorreu 5 anos atrás e toda a situação se passou novamente na minha cabeça. Dei uma desculpa qualquer, parei de falar com ele, fui tomar um café. Tive um dos piores momentos da minha vida profissional tentando mudar a forma de trabalho de alguém, gastei uma quantidade IMENSA de energia e 5 anos depois o mesmo caboclo aparece falando do mesmo problema, sem um milímetro de diferença. E daí me caiu a ficha de que se eu não tivesse feito nada lá atrás provavelmente eu não teria tido todo o estresse que tive e até quem sabe a demanda maluca dele nem fosse adiante. Agora também eu já sei o que fazer para resolver o problema caso a demanda escale. Então deixei o caboclo de lado e caí em campo para resolver outras coisas e continuar trabalhando da melhor forma que posso.
Esse insight que tive essa semana para não ir adiante com a discussão só foi possível graças à Bastter.com e todo o esforço da comunidade para todos os dias nos lembrar que somos burros e o que importa é família, saúde, trabalho, aporte, tempo.