Boa noite! Outro dia, refletindo sobre o conteúdo de diversos bodes do Bastter, incluindo o bode "e eu nunca mais olhei para trás", lembrei-me desse texto da psicanalista Ana Suy. Creio que um dos monstros pelos quais mais temos apego nessa vida talvez seja o nosso passado e, mais precisamente, os erros que supostamente cometemos nele. Enfim, acho que vale a leitura.
- A gente se apaixona pelos nossos monstros-
Autora: Ana Suy
"A gente curte os nossos monstros.
Começa a coçar a picada de butuquinha, coça um pouco mais, pensa que vai coçar só mais um pouquinho, e quando vê está sagrando.
A gente se interessa pelos nossos monstros.
Dá uma stalkeadinha inocente, outra amadora e acaba por se profissionalizar em viver a vida alheia.
A gente cuida dos nossos monstros.
Tagarela sobre superficialidades e mazelas inalteráveis, mas deixa crescer o imenso silêncio em torno daquilo que verdadeiramente importa.
A gente se fixa em nossos monstros.
Repete a mesma história, o mesmo lamento, a mesma queixa, para exatamente a mesma pessoa, que ouve do mesmo lugar - e não leva ninguém a lugar algum: inúmeras vezes.
A gente se encanta pelos nossos monstros.
Começa a odiar um pouquinho, com ancoragem na realidade - se empolga com a satisfação de odiar e logo mais está torcendo pelo pior, para odiar com gosto, motivos e argumentos, mais e mais.
A gente se deixa seduzir pelos nossos monstros.
Monopoliza para si a leitura de algo que seria fundamental compartilhar com o outro e se espanta com o fato de o outro ter a ousadia de, sendo outro, não ter acesso ao nosso pensamento, tão bem fundamentado e seguro em nós mesmos.
A gente flerta com os nossos monstros.
Mas não os põe pra falar, não toma chá, café ou vinho com eles e os enfia dentro do armário rápido demais quando alguém se aproxima.
A gente se apaixona pelos nossos monstros - e assim, se deixa engolir por eles." (Autora: Ana Suy)