Eis um cenário prático e real:
João recebe R$ 1.000 por mês. Esse é o seu salário bruto.
Desse valor, João paga 8% para o INSS. Isso dá R$ 80.
Seu patrão paga 20% desse valor também para o INSS. Isso dá R$ 200.
Por mês, portanto, João e seu patrão pagam R$ 280 ao INSS.
Esse é o valor que o governo confisca de João com o intuito de "cuidar" dele no futuro: o equivalente a 28% do salário bruto de João. Para o governo, João é tolo demais para administrar o próprio dinheiro. Tal tarefa será feita com muito mais carinho e dedicação por burocratas estatais.
Em troca de quê?
De acordo com as novas regras da Previdência que o governo pretende implantar, João terá de trabalhar por 49 anos para conseguir se aposentar com seu salário integral. Ou seja, João e seu patrão terão de pagar, mensalmente, R$ 280 ao INSS durante 49 anos para que, no ano de 2066, João se aposente e receba uma aposentaria mensal de... R$ 1.000.
(Para facilitar o exemplo, estou considerando inflação zero pelos próximos 49 anos. Isso significa que, em 2066, R$ 1.000 terão o mesmo poder de compra que têm hoje. Essa forma de raciocinar tem a vantagem de pensarmos tudo em valores de hoje para qualquer época futura, o que mantém o raciocínio mais claro.)
Portanto, ficamos assim: durante 49 anos, João terá dado R$ 178.360[1] para o governo em termos de INSS. (Estou incluindo o 13º salário)
Em troca disso, a partir do ano 2066, ele ganhará R$ 1.000 por mês (em valores de hoje). Isso significa que, a partir de 2066, ele terá de viver pelo menos mais 179 meses (15 anos) para ao menos conseguir recuperar todo o valor que deu para o governo.
Como seria se João tivesse liberdade
Agora vejamos qual seria a situação de João daqui a 49 anos caso ele tivesse liberdade para fazer o que quisesse com esse dinheiro.
Sem qualquer pirotecnia, imagine que João aplicasse esses mesmos R$ 280 mensais destinados ao INSS em títulos públicos por meio do Tesouro Direto. (Absolutamente qualquer pessoa, de qualquer renda, sem ter de pagar nenhuma taxa, pode aplicar no Tesouro Direto.)
Mais especificamente, imagine que João aplicasse mensalmente no título Tesouro IPCA+ (também chamado de NTN-B Principal), que paga uma taxa média de 6% de juros reais anuais. Ou seja, esse título paga um valor 6% acima da inflação total de cada ano.
Quanto João teria daqui a 49 anos? Ele teria toda a inflação acumulada no período de 49 anos e mais um ganho extra de 6% ao ano durante 49 anos. Quanto dá R$ 280 rendendo 6% ao ano de juro real (ou seja, acima da inflação) durante 49 anos?
Nada menos que R$ 1,038 milhão em valores de hoje.[2]
Ou seja, daqui a 49 anos, João teria à sua disposição uma quantia cujo poder de compra equivale a R$ 1,038 milhão de hoje. Nada mau.
Mas agora vem o principal: esse R$ 1,038 milhão (em valores de hoje) que João terá daqui a 49 anos, caso continuem aplicados a 6% de juros reais ao ano (0,49% ao mês), renderão a ele nada menos que R$ 5.086 por mês (em valores de hoje).
Agora compare e se espante:
No primeiro cenário, tudo o que restou a João é receber R$ 1.000 por mês (em valores de hoje). E só. Ele não tem mais nada. Todo o dinheiro que ele deu para o INSS (R$ 178.360) se perdeu. Ele não tem acesso a ele. Tudo o que lhe restou, repetindo, é receber R$ 1.000 por mês.
Já no segundo cenário, João não apenas terá R$ 1,038 milhão em sua posse, como ainda estará ganhando mais R$ 5.086 por mês só com os juros incidentes sobre esse R$ 1,038 milhão!
(Sim, haverá imposto de renda de 15% sobre esse valor; ainda assim, a diferença de realidade é absurda).
Eis, portanto, as alternativas de João: patrimônio nenhum acumulado e apenas R$ 1 mil por mês para sobreviver, ou patrimônio de R$ 1,038 milhão acumulado mais uma renda mensal de R$ 5.086 por mês.
Isso, e apenas isso, já deveria bastar para acabar com qualquer debate sobre a Previdência. Qual a moralidade desse arranjo?
Desnecessário enfatizar que, no segundo cenário, quanto mais João conseguir poupar a cada mês trabalhado, maior será o seu montante final acumulado. Apenas para se ter uma ideia, se ele conseguir poupar R$ 10 adicionais por mês — ou seja, R$ 290 em vez de R$ 280 —, seu montante final será de R$ 1,077 milhão, ou seja, R$ 39 mil a mais. Isso dará a João uma renda mensal de R$ 5.277 (R$ 191 a mais por mês). Tudo isso com apenas R$ 10 a mais por mês.
Essa é a mágica dos juros compostos.