Textão de 1988 .. e extremamente contemporâneo..
AS VERDADES PRÁTICAS DO MERCADO ACIONÁRIO (Transcrito de Balanço Financeiro, julho de 1988)
Diversos amigos meus atuam na Bolsa de Valores como profissionais, e sua característica comum é a de serem homens extremamente práticos. Para eles, a Bolsa é o que é: um local de trabalho onde se conciliam as vontades de comprador e do vendedor.
Todos fazem caçoada dos teóricos que gravitam pela periferia do mercado, dando aos crédulos explicações ou razões das altas e das baixas tentando enxergar cotações futuras em letras e desenhos cabalísticos.
Enquanto os práticos ganham dinheiro, os teóricos se realizam fazendo adeptos. Ultimamente, leitores têm me pedido para ajudá-los a interpretar "topos duplo", "gaps de quebra" e "retas de pescoço". Outros falam com desembaraço a respeito de efficient markets, contrary opinions e índices beta de risco.
Barbaridade. Bolsa não é nada disso. Os investidores deveriam comprar ações com a mentalidade de mulheres que compram laranjas nas feiras. Elas só se preocupam em distinguir as laranjas doces das azedas e pagar o preço mais barato possível.
Há anos convenci-me de que foge do bê-á-bá da Bolsa não vale nada nas épocas de baixa nem nas de estabilidade. Também não vale nada nas épocas de alta, mas aí todo mundo ganha dinheiro comprando qualquer papel, do lixão ás blue-chips, porque todas as ações sobem independentemente de qualquer manipulação, e então os tecnicistas se colocam sob a luz dos holofotes como se fossem personagens da maior importância. Coitados. Os personagens realmente importantes costumam ficar na sombra, no canto mais escondido da plateia.
Ações de empresas que não rendem nada fazem movimentos nos pregões e são muito compradas e vendidas, e alguns participantes ganham muito dinheiro desprezando essas verdades.
Que ganhem. Se não ganhassem, eles se desinteressariam do jogo e voltariam suas atenções para outros lugares. Se todos fizessem como nós, que só compramos e guardamos, não existiria bolsa como a conhecemos, e um dia, quando tentássemos comprar, não encontraríamos ninguém que quisesse vender.
Multidões de Investidores nunca especularam. São pessoas que não cursaram faculdades, que não sabem para que serve a matemática financeira, que não usam computadores em seus negócios particulares e que falam a nossa língua de homens comuns, mas que conquistaram a independência financeira no mercado de ações aplicando sistematicamente um capital que não fazia falta nas despesas do dia a dia.
Comprar, comprar e comprar ações de empresas sólidas até alcançar o objetivo final, e ficar longe do agitado mundo da Bolsa e suas más influências eis o segredo.
É conselho prático, decepcionante por sua simplicidade e que por isso mesmo as pessoas de mente complicada relutam em aceitar.
A única realidade concreta do Mercado são as ações de empresas sólidas que o Investidor genuíno mantém em carteira para delas usufruir benefícios no futuro.
Muitos especuladores demoram anos para compreender essa verdade tão simples. Felizes daqueles que a compreendem a tempo de ter força e disposição para recomeçar no caminho certo.