Pessoal, nunca fui de expressar-me muito bem com palavras . De uns tempos para cá, depois de ter recebido ótimos conselhos da comunidade, resolvi enfrentar o problema de frente. Eis o primeiro texto que escrevo com fins não profissionais.
Escolhi esse livro pq achei o tema central comovente, e pelo fato de tê-lo lido quando tinha apenas 20 anos. A minha compreensão da obra hoje é completamente diferente da que tive na primeira leitura.
Segue o texto:
A Regeneração por meio do sofrimento em “Crime e Castigo”.
O romance “Crime e Castigo”, escrito por Fiódor Dostoiévski e publicado em 1866, narra a prática de um assassinato brutal e as consequências psicológicas advindas ao autor dos crimes.
Raskolnikov, estudante de direito que interrompeu seus estudos universitários, vive em um pequeno cubículo alugado em São Petersburgo. Apesar da pobreza e da falta de perspectivas, o personagem, inspirando em Napoleão Bonaparte, julga pertencer a uma classe distinta de pessoas para as quais a lei não deve ser aplicada da mesma maneira que é às pessoas ordinárias.
A forma com que o personagem enxerga a si e muitas de suas opiniões expostas em diálogos representam as chamadas “novas ideias” que se disseminavam na Europa. Tais ideias surgiram a partir de Cleitons que desconstruíam conceitos tradicionais, propagavam modificações sociais urgentes e radicais, e repudiavam a existência de Deus e a obediência aos preceitos bíblicos.
O protagonista executa o plano previamente elaborado: invade um apartamento e, com o uso de um machado encontrado na rua, assassina a velha usurária que emprestava dinheiro para os estudantes da região.
Inesperadamente, outra pessoa adentra no apartamento e encontra o corpo falecido na sala. Era a irmã da vítima. Raskolnikov, que não planejara este segundo crime, comete novo assassinato violento e aturdido com a situação foge do local.
A partir daí o romance explora as consequências psicológicas do crime praticado. Raskolnikov aparenta não se arrepender da consumação do plano, mas, no entanto, suas atitudes demonstram haver uma grande e progressiva desordem interna. As joias e o dinheiro roubados, por exemplo, sequer foram minuciosamente analisados pelo autor dos crimes.
O protagonista adoece, é atormentado por delírios e pesadelos e tem a crescente sensação de que não pertence àquela categoria distinta em que se colocou, pois se, de fato fosse uma pessoa extraordinária, não sofreria pela prática de um crime que julgava ser tão insignificante. Novamente compara-se a Napoleão, que foi responsável pela morte de milhares de soldados enviados à guerra, e não compadecia-se de remorsos e culpa.
Na noite anterior ao crime Raskolnikov conheceu a história de Sonia Marmeladov, de apenas 18 anos, bastante magra e pequenina, mas que se entregou à prostituição para, na ausência do pai alcoólatra que faleceu em situação deplorável, prover o sustento de seus irmãos pequenos e de sua madrasta acometida com tuberculose.
O desenrolar da trama nos mostra que o crime praticado deixou rastros e que o comportamento incoerente e inusitado de Raskolnikov tornou-o suspeito da prática dos crimes.
Não suportando mais as pressões externas e internas, Raskolnikov decide confessar a prática do crime à Sonia, com quem iniciou um relacionamento amoroso.
A reação de Sônia diante da confissão dos crimes demonstra que a situação degradada em que vivia não foi suficiente para retirar-lhe a essência pura, a fé e a percepção de que enfrentar o sofrimento é necessário para cada um de nós.
A jovem prostituta compreende que o verdadeiro caminho a Raskolnikov seria confessar a prática dos crimes e aceitar a dura pena que lhe seria imposta pelas autoridades. Outras atitudes não serviriam para que alcançasse a expiação dos pecados cometidos, e ele viveria atormentado e doente pelo resto de seus dias.
Embora não tenha expressado, Sonia tinha, desde aquele momento, a clara intenção de acompanhar Raskolnikov em seu severo e incerto destino. O sofrimento, portanto, seria também experimentado por ela.
Raskolnikov reluta, pensa em fugir ou suicidar-se, porém, ao final, mesmo não se arrependendo dos crimes, confessa-os e é enviado à Sibéria para oito anos de trabalhos forçados.
O início do cumprimento da pena é bastante sofrido, pois o protagonista continua sem enxergar qualquer justificativa para aquele sofrimento, passa os dias calado e cabisbaixo, despreza e sente repulsa pelos outros detentos, e considera-se um estranho diante deles. De certa maneira, ele ainda não se livrou das ideias que o levaram à pratica dos crimes e o tornaram uma pessoa vazia e perturbada. A confissão do crime e o cumprimento da pena são motivos de humilhação e vergonha.
Acontece que Sônia adoece e fica distante por alguns dias. Raskolnikov, sem ter ciência que o quadro não era grave, desespera-se com a ausência e finalmente percebe o quanto a amava.
O dia do reencontro marca o surgimento de uma nova vida para o protagonista, quando finalmente consegue compreender o significado de tudo o que ele causou e sofreu até então.
Sem saber como, ele se joga aos pés de Sonia, abraça suas pernas e as beija enquanto chora. Sonia ilumina-se de alegria ao compreender o significado daquela atitude inusitada.
Uma grande mudança interna ocorre no protagonista, que passa a conversar e interagir com os outros detentos, a expressar os sentimentos que sente por Sonia e finalmente consegue livrar-se dos tormentos e pesadelos que o perseguiam. Nas palavras do Autor do livro: “Em lugar da dialética, começava a vida e, na consciência, devia elaborar-se algo completamente distinto.”
O crime lhe parece um episódio muito antigo e cometido por um estranho. Lembra-se do Evangelho que lhe fora dado por Sonia e que guardava embaixo de seu travesseiro. Em outros tempos Sonia havia lido para ele a passagem bíblica que narra a ressureição de Lázaro ( João 11: 1-29)
Consta dessa passagem bíblica que:
“A essa notícia, Jesus disse: Essa doença não é mortal, mas para a glória de Deus, para que, por ela, seja glorificado o Filho de Deus”
Raskolnikov recebe a possibilidade de arrepender-se e modificar a antiga vida que levava. Ademais, falta apenas sete anos para que cumpra integralmente a pena e possa viver uma vida normal ao lado de Sonia.